Dieta humana nos últimos 20 mil anos trouxe grandes mudanças físicas

A dieta humana através dos milênios moldou nosso trajeto evolutivo. “Nos últimos milhões de anos aconteceram mudanças na anatomia humana, dentes e crânio, que acreditamos estarem relacionadas à dieta”, diz o antropólogo John Hawks, da Universidade de Wisconsin-Madison (EUA).
Como ainda continuamos evoluindo, o papel crucial da dieta não deixou de existir. O que comemos hoje pode influenciar a direção que tomaremos amanhã.

Leite


Quando mamíferos são filhotes, eles produzem uma enzima chamada lactase para ajudar a digerir a lactose do leite materno. Assim que esses bebês crescem, o leite deixa de ser uma opção de alimento e a enzima não é mais necessária, então mamíferos adultos geralmente param de produzi-la.

Um terço dos seres humanos, porém, continua produzindo a enzima durante toda a vida, o que significa que são tolerantes à lactose depois da infância. O curioso é que diferentes partes do mundo mostram maior ou menor tolerância ao açúcar do leite. Pessoas de países do leste asiático, oeste africano, Grécia e Itália são especialmente intolerantes à lactose, enquanto 95% das pessoas do norte da Europa são tolerantes ao açúcar.
“Em pelo menos cinco casos diferentes, populações melhoraram o gene responsável por digerir o açúcar para que ele continue ativo na fase adulta”, diz Hawks.
Testes de DNA antigos mostram que essa tolerância à lactose é recente. Há 20 mil anos, esta habilidade só existia entre bebês e crianças pequenas. Hoje, 33% da população mundial consegue digerir bem o leite.
Esta mudança evolutiva sugere que consumir o leite diretamente ao invés de ter que fermentá-lo para fazer iogurte ou queijo seria uma vantagem. Na fermentação, bactérias quebram os açúcares do leite, facilitando a digestão. Mas essas bactérias cobram um preço: uma boa parte das calorias do alimento é consumida por elas.
Portanto, as pessoas que viviam em um ambiente com pouca oferta de alimento conseguiam consumir mais calorias se tomassem o leite sem precisar fermentá-lo. Quem tivesse acesso a vacas, ovelhas, cabras ou camelos consumia mais energia e se saía melhor que aqueles adultos que não conseguiam digerir este alimento.
Hoje em dia, porém, muita gente tem acesso a alimentos de todos os tipos ou a comprimidos de lactase que ajudam na digestão dos laticínios. Isso significa que tolerância a lactose pode não ter o mesmo impacto que tinha antigamente.

Trigo


A habilidade de digerir glúten – a principal proteína do trigo – também é relativamente nova na história da humanidade. Nós não começamos armazenar e comer grãos com regularidade até 20 mil anos atrás, e a plantação de trigo só começou há 10 mil anos.

As pessoas que sofrem com a doença celíaca têm uma reação imunológica à ingestão do glúten, uma proteína do trigo, cevada e centeio. A prevalência da doença celíaca, porém, não parece estar aumentando nem diminuindo nos últimos milênios.

Carboidrato

Outros exemplos de evolução através da dieta são bastante misteriosos. A amilase salivar é a enzima responsável pela digestão dos carboidratos. Historicamente, pessoas do oeste da Eurásia e da Mesoamérica têm mais cópias do gene responsável por sua produção. Isso significa que essas pessoas foram selecionadas para diferir carboidratos melhor? “Isso é convincente e pode ser verdade. Mas a biologia é complicada e não sabemos com certeza como isso funciona e qual a importância disso”, diz Hawks.

Alimentação com menos peixe


É possível que a dieta também influencie na cor da pele. A hipótese principal sobre a variedade de tons de pele no mundo todo diz que populações de países de baixas latitudes recebem mais raios UV e desenvolvem mais melanina para proteger a pele dos danos solares. Já as populações que recebem menos raios UV conseguem sintetizar a vitamina D de forma mais eficiente com menos melanina.

Mas estudos de DNA que comparam ucranianos modernos com seus ancestrais pré-históricos mostram que a cor de pele dos Europeus tem mudado nos últimos 5 mil anos. Para explicar isso, outra teoria sugere que a cor da pele pode ter sido influenciada pela dieta, quando os primeiros fazendeiros sofriam com pouca vitamina D, já que não tinham acesso a alimentos que são fonte desta vitamina. Alguns alimentos como salmão, atum, sardinha e ovos são fontes da vitamina D, embora o sol seja responsável por entre 80% e 90% de toda a vitamina D que o corpo sintetiza.
Nina Jablonski, pesquisadora sobre cores de pele da Universidade do Estado da Pensilvânia (EUA) afirmou à revista Science que pesquisas “trazem evidências de que a perda de dieta regular com vitamina D como resultado da transição para um estilo de vida em torno da agricultura pode ter engatilhado a evolução para cores mais claras”.

De olho na evolução

É difícil ver a evolução acontecendo. Mas novas tecnologias como sequenciamento de genoma e programas que conseguem analisar a quantidade massiva de dados estão tornando possível encontrar pequenas mudanças genéticas que podem se somar por muitas gerações e resultar em grandes mudanças físicas.
Hakhamanesh Mostafavi, bióloga evolucionista da Universidade Columbia (EUA) é autora de um estudo que analisou o DNA de 215 mil pessoas para tentar ver como nós continuamos a evoluir em apenas uma ou duas gerações. “Obviamente nossa dieta está mudando radicalmente hoje, então não sabemos que efeito evolutivo isso pode ter. É possível que a mudança não tenha um efeito direto na seleção, mas pode interagir com genes que controlam uma característica”, diz ela. [Smithsonian.com]

Postar um comentário

0 Comentários