A floresta amazônica está agora emitindo mais dióxido de carbono do que é capaz de absorver, confirmaram cientistas pela primeira vez.
As emissões chegam a um bilhão de toneladas de dióxido de carbono por ano, de acordo com um estudo. A floresta gigante já havia sido um gigantesco sumidouro de carbono, absorvendo as emissões que impulsionam a crise climática, mas agora está causando sua aceleração, disseram pesquisadores.
A maioria das emissões são causadas por incêndios, muitos criados propositalmente para limpar terra para a produção de carne bovina e soja. Mas mesmo sem incêndios, temperaturas mais quentes e secas significam que o sudeste da Amazônia tornou-se uma fonte de CO2, em vez de absorvê-lo.
Perder o poder da Amazônia de captura de CO2 é um alerta de que a redução das emissões de combustíveis fósseis é mais urgente do que nunca, disseram os cientistas.
A pesquisa utilizou aviões pequenos para medir os níveis de CO2 até 4.500m acima da floresta na última década, mostrando como toda a Amazônia está mudando. Estudos anteriores que indicavam que a Amazônia estava se tornando uma fonte de CO2 foram baseados em dados de satélite, que podem ser dificultados pela cobertura de nuvens, ou medições de árvores terrestres, que podem cobrir apenas uma pequena parte da vasta região.
Os cientistas afirmaram que a descoberta de que parte da Amazônia estava emitindo carbono mesmo sem incêndios foi particularmente preocupante. Eles disseram que provavelmente foi o resultado do desmatamento e dos incêndios de cada ano tornando as florestas adjacentes mais suscetíveis no ano seguinte. As árvores produzem grande parte da chuva da região, então menos árvores significa secas mais severas, ondas de calor piores, mais mortes de árvores e incêndios.
O governo do presidente Jair Bolsonaro tem sido duramente criticado por incentivar mais desmatamento, que subiu para uma alta de 12 anos, enquanto os incêndios atingiram seu nível mais alto em junho desde 2007.
Luciana Gatti, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais do Brasil e que liderou a pesquisa, disse: “A primeira notícia muito ruim é que a queima de florestas produz cerca de três vezes mais CO2 do que a floresta absorve. A segunda má notícia é que os locais onde o desmatamento é 30% ou mais mostram emissões de carbono 10 vezes maiores do que onde o desmatamento é inferior a 20%.”
Menos árvores levam a menos chuva e temperaturas mais altas, tornando a estação seca ainda pior para a floresta restante, ela disse: “Temos um ciclo muito negativo que torna a floresta mais suscetível a incêndios descontrolados”.
Grande parte da madeira, carne bovina e soja da Amazônia é exportada do Brasil. “Precisamos de um acordo global para salvar a Amazônia”, disse Gatti. Algumas nações europeias disseram que bloquearão um acordo comercial da UE com o Brasil e outros países, a menos que Bolsonaro concorde em fazer mais para combater a destruição amazônica.
A pesquisa, publicada na revista científica Nature, uma das mais conceituadas no mundo, envolveu a tomada de 600 perfis verticais de CO2 e monóxido de carbono, que é produzido pelos incêndios, em quatro locais da Amazônia brasileira de 2010 a 2018. Constatou-se que os incêndios produziam cerca de 1,5 bilhão de toneladas de CO2 por ano, com o crescimento florestal removendo meio bilhão de toneladas. O bilhão de toneladas deixadas na atmosfera equivale às emissões anuais do Japão, o quinto maior poluidor do mundo.
“Este é um estudo realmente impressionante”, disse o Prof. Simon Lewis, da University College London. “Voar a cada duas semanas e manter medições de laboratório consistentes por nove anos é um feito incrível.”
“O feedback positivo, onde o desmatamento e as mudanças climáticas impulsionam a liberação de carbono da floresta restante que reforça o aquecimento adicional e mais perda de carbono é o que os cientistas temiam que acontecesse”, disse ele. “Agora temos boas evidências de que isso está acontecendo. A história do sudeste da Amazônia é mais um alerta de que os impactos climáticos estão acelerando.”
O Prof. Scott Denning, da Universidade estadual do Colorado, EUA, disse que a campanha de pesquisa aérea foi heróica. “No sudeste, a floresta não está mais crescendo mais rápido do que está morrendo. Isso é ruim – ter o absorvedor de carbono mais produtivo do planeta mudar de um sumidouro para uma fonte significa que temos que eliminar combustíveis fósseis mais rápido do que pensávamos.”
Um estudo de satélite publicado em abril descobriu que a Amazônia brasileira liberou quase 20% mais dióxido de carbono na atmosfera na última década do que absorveu. Uma pesquisa que rastreou 300.000 árvores ao longo de 30 anos, publicada em 2020, mostrou que as florestas tropicais estavam ocupando menos CO2 do que antes. Denning disse: “São estudos complementares com métodos radicalmente diferentes que chegam a conclusões muito semelhantes.”
“Imagine se pudéssemos proibir incêndios na Amazônia – poderia ser um sumidouro de carbono”, disse Gatti. “Mas estamos fazendo o oposto – estamos acelerando as mudanças climáticas.”
“A pior parte é que não usamos a ciência para tomar decisões”, disse ela. “As pessoas pensam que converter mais terras para a agricultura significará mais produtividade, mas na verdade perdemos produtividade por causa do impacto negativo na chuva.”
Pesquisa publicada na sexta-feira estimou que a indústria de soja do Brasil perde US$ 3,5 bilhões por ano devido ao aumento imediato do calor extremo que se segue à destruição da floresta. [The Guardian]
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